setembro 14, 2008

Uma Marca para Joinville

Em fevereiro de 2005 o governo lançou a Marca Brasil, criada pelo arquiteto e designer Kiko Farkas, para promover os produtos e serviços brasileiros no exterior. Foram investidos R$ 4 milhões no processo de criação da marca, que envolveu pesquisas com empresas e estrangeiros que visitaram o Brasil, além de potenciais turistas. Foram ouvidos 190 operadores turísticos de 18 mercados, 1.200 turistas que visitaram o país e 5.000 pessoas de 18 países que nunca estiveram aqui.

A função da Marca Brasil é agregar valor aos produtos e serviços brasileiros, além de ajudar nas exportações. Trata-se de uma espécie de selo de origem controlada, que, de acordo com as normas para seu uso, acompanhará os produtos de qualidade para exportação e todas as ações brasileiras voltadas para o exterior. Segundo Farkas, a marca que criou para o Brasil “é a impressão digital de um país-continente feito de belezas naturais, luminosidade, festas populares e manifestações culturais, traduzidos em cores que se superpõem, criando outras tonalidades, na nova imagem-símbolo”.
Uma Marca País funciona da mesma forma que a imagem corporativa de uma empresa. Através dela se tem a percepção internacional de uma determinada nação. É fato, por exemplo, que tendemos a associar valores com produtos de certos países, como por exemplo: a confiabilidades dos produtos alemães, o bom desenho dos produtos italianos, a inovação dos produtos japoneses ou o baixo preço dos produtos chineses. Por isso, se um país sabe vender bem sua imagem internacionalmente, poderá vir a ganhar muito com isso sob vários aspectos. Trata-se de uma busca por identidade num mundo hoje tão globalizado e de mercado super concorrido.

O Sol do artista catalão Joan Miro, marca da Espanha, talvez seja um dos exemplos mais conhecidos. A símbolo de Miró é certamente a porta de entrada do país na indústria do turismo e o transformou em um pólo de atração de investimentos significativos. É hoje uma das marcas-país mais valiosas do planeta. O Reino Unido, Alemanha, Canadá, França, Suíça, Austrália, Suécia, Itália, Japão e EUA são os Top 10. O Brasil também não está mal, ficando sempre entre os vinte países de marcas mais fortes no turismo.
Sobre esse assunto, li na semana passada no jornal ANoticia, um artigo muito interessante chamado “Construir a marca Joinville” , escrito pelo jornalista e publicitário José António Baço. Nele Baço critica a obviedade e falta de novidade das propostas dos nossos candidatos à Prefeitura de Joinville, para os quais falta visão estratégica de longo prazo, e lança a idéia da criação de uma “Marca Joinville” , seguindo a tendência das Marcas-País.

“Uma cidade deve ser governada tanto por métodos políticos quanto empresariais. E um administrador tem a obrigação de saber que toda boa gestão é feita de ações táticas e ações estratégicas. (...) Os planos estratégicos pedem inventividade, ousadia e visão de futuro. É essencial projetar a cidade para as próximas duas, três décadas ou mais. E para isso é preciso resistir à tentação de governar apenas com os olhos nas eleições”, diz Baço. Sobre o artigo repassamos alguns trechos:
[ “O investimento na imagem é algo que algumas cidades vêm fazendo há muito tempo. E por isso hoje são marcas fortes. Quem não se lembra do caso do designer Milton Glaser, em Nova York? Há 30 anos, a cidade que nunca dorme efetivamente perdeu o sono. Havia muita violência, as ruas tinham mau aspecto e os turistas simplesmente desapareceram. A administração de Nova York estava à beira da falência.

Foi aí que as autoridades decidiram investir numa campanha para devolver a auto-estima aos nova-iorquinos e conquistar os forasteiros. E lançaram as peças publicitárias com o famoso "I Love NY". Foi nesse momento que surgiu o lance tão simples quando genial de Milton Glaser, que criou a marca "I - coraçãozinho - NY". Hoje a cidade tem uma marca fortíssima.

Aliás, não é o único episódio a envolver um designer. Um caso interessante é o de Manchester, na Inglaterra, que há alguns anos contratou o designer Peter Saville (conhecido principalmente por seu trabalho com capas de álbuns para as bandas Joy Division, New Order e outros músicos de Britpop) para ocupar um cargo inusitado: diretor de criação da cidade. Manchester era uma cidade feia, chuvosa, triste. E precisava construir uma marca.

Depois da explosão de uma bomba do IRA, que em 1996 destruiu o centro vitoriano da cidade, as autoridades decidiram reconstruir o local. E mais: essa seria a semente para mudar a imagem da cidade. Peter Saville chegou ao conceito de "Manchester Original Modern". E faz questão de explicar que não é um slogan, mas um significante que revela a nova Manchester. Há uma série de ações concretas por trás desse conceito.

Desenvolver uma marca-cidade exige um exercício sério de branding, que vai muito além de um slogan e um logotipo. Deve-se criar percepções, introduzir valores e conquistar um território na mente das pessoas, de dentro e de fora da cidade. A marca-cidade é um ativo estratégico que ajuda a atrair investimentos, impulsionar as trocas comerciais, incrementar o turismo ou mesmo captar a atenção da mídia.

Construir uma marca é um trabalho difícil e os resultados demoram a aparecer. E, claro, não dá votos no curto prazo. Talvez isso explique o fato de nenhum político no poder se ter dedicado ao tema. Mas uma coisa é certa: quem investiu - e investiu bem - na construção da marca-cidade não tem do que se queixar.

Milão é moda. Nova York é efervescência. Paris é romance. Barcelona é cultura. Tóquio é modernidade. E Joinville é... Fica a pergunta: como a cidade é percebida dentro e fora das suas fronteiras? O fato é que não existe uma imagem forte e sustentada, porque as autoridades nunca se preocuparam em elaborar um projeto a sério.

As pessoas ingenuamente alimentam a ilusão de que basta escolher um tema e escrever frases. Joinville pode ser, por exemplo, a Cidade das Flores, Cidade das Bicicletas, Cidade da Dança, a Manchester Catarinense ou um pedaço da Europa no Brasil. Mas nenhuma dessas imagens se firmou porque não é fruto de um trabalho estratégico bem articulado. E porque talvez Joinville não seja nada disso.


É preciso que o próximo prefeito consiga ver para além das eleições e tenha coragem de lançar um olhar sobre o futuro. A questão é a seguinte: que cidade Joinville quer ser em 2030 ou 2040? Parece tempo demais para os políticos de vistas curtas, mas é um trabalho que precisa ser feito. E com método, organização e ambição.
Criar uma marca é também ter respostas para perguntas simples que um estrangeiro ou um brasileiro de outra região poderia fazer.

- Por que eu devo fazer turismo em Joinville?

- Por que a minha empresa, que é da geração digital, iria para Joinville?

- Por que eu deveria considerar Joinville uma opção cultural?

- Por que eu, que sou um "cérebro", devo transferir o meu quociente intelectual para Joinville?

A maioria dessas perguntas teria respostas insatisfatórias. Porque não existe uma idéia clara do que Joinville representa na mente das pessoas. Hoje a cidade é um bom destino para os migrantes e para as empresas que vivem pela lógica das chaminés. Mas o mundo vive tempos pós-industriais e é necessário cada vez mais investir num progresso limpo e tentar atrair cérebros. Joinville quer ter uma imagem parecida com o Silicon Valley ou com a cidade de Cubatão?


Criar uma marca-cidade não é uma simples campanha de publicidade. (...) A marca não vive de frases, anúncios ou filmes, mas de um conceito. É preciso mudar mentalidades. É preciso levar a imaginação ao poder.” ]

José António Baço, jornalista e publicitário, pós-graduado em comunicação e marketing (INP-Lisboa), especialista em Pensamento Contemporâneo (PUC-PR), mestre em Cultura e Comunicação (UCP-Lisboa) e doutorando em Ciências da Comunicação (UNL-Lisboa). Aos domingos, escreve na revista Anexo D, de "A Notícia".

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