maio 24, 2011

"Arquitetura de Joinville embarca no estilo contemporâneo"

O título acima bem que poderia ser verdade, mas ainda não é por aqui que a boa arquitetura está transformando uma cidade (talvez um exemplo aqui....outro ali). A reportagem original, de Vanessa Correa e Fernando Serapião (Folha de S.Paulo, 22/05/2011), fala de São Paulo e anuncia que os prédios neoclássicos, ornamentados, já são mais raros entre os lançamentos da capital paulista e que a mudança mostra uma a sociedade que passou a valorizar o futuro (não o passado) e a qualidade dos espaços.

Um bom exemplo a ser seguido por outras cidades e seus governantes; um #ficadica às construtoras que muitas vezes recusam dos arquitetos propostas de projetos contemporâneos sob a justificativa de que "não vende"; aos envolvidos com a construção civil que - por ignorância ou falta de informação - perpetuam edificações ultrapassadas e à muitos arquitetos que ainda aceitam encomendas absurdas como o neoclássico. Certamente você identificará em sua cidade exemplares como estes do texto.

Por isso, é importante que se discuta e se apresentem novas possibilidades. Difundir o estilo e educar a sociedade, fazendo arquitetura que fale de nossa época. É normal não gostar do que não se conhece ou não estamos acostumados. Afinal, como diria Lina Bo Bardi: "quando um design é arrojado demais temos dificuldade em compreender sua beleza".

Prédio de arquitetura contemporânea na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo.
Alessandro Shinoda - 21.mai.11/Folhapress

Por Vanessa Correa
de São Paulo

Depois de mais de uma década de ditadura do neoclássico, os prédios paulistanos chegaram ao século 21. Agora, com a fachada limpa, os lançamentos começam a exibir a linguagem arquitetônica contemporânea.
Com suas colunas e ornamentos, o estilo neoclássico foi muito procurado porque dava impressão de ser de mais alto padrão, afirmam arquitetos e construtoras. Hoje, os lançamentos nesse estilo são mais raros.
"Mas uma fachada contemporânea, se for feita por um bom arquiteto, também pode mostrar que o prédio é de alto padrão", diz Kátia Varalla, diretora de produto da construtora Gafisa, que já não constrói neoclássicos.
Para arquiteta Nádia Somekh, professora da Universidade Mackenzie, essa mudança de comportamento mostra que "a sociedade não está mais valorizando o passado e sim o futuro, a qualidade dos espaços". Os arquitetos, no entanto, torcem o nariz para o contemporâneo de alguns lançamentos do mercado imobiliário, que veem mais como um "verniz" para vender.
De acordo com Somekh, um projeto contemporâneo se caracteriza pela qualidade e flexibilidade dos espaços, pelo diálogo do projeto com a cidade, além do respeito à natureza, com o uso de novos materiais e racionalização do processo construtivo. Esses itens, alguns projetos que se vendem como contemporâneos não têm. No entanto, para além das fachadas, as mudanças de estilo já chegam às plantas de alguns edifícios.
Há seis anos a construtora Zarvos, que atua na Vila Madalena e arredores, aposta no contemporâneo. "Neste ano, entre construção e projeto, estamos com 15 prédios", diz Otávio Zarvos, dono da empresa, que só faz edifícios com esse tipo de arquitetura.
Além da fachada "autoral, com uma estética bacana", os projetos da construtora, diz Otávio, buscam internamente o equilíbrio da iluminação, ventilação e flexibilidade da planta, que pode ser modificada depois de pronta.
Agora, arquitetos que fizeram na Zarvos seus primeiros projetos de prédios contemporâneos residenciais, como Marcelo Moretin e o escritório Triptyque, já estão sendo chamados por grandes construturas, diz Otávio Zarvos.


ALÉM DA ELITE

O novo jeito de construir também encontra espaço fora das áreas mais valorizadas.
Em São Miguel Paulista, bairro periférico da zona leste, um inusitado empreendimento contemporâneo (veja na pág. C4) esgotou as 24 unidades disponíveis antes mesmo do lançamento oficial, na última semana.
As casas-apartamento em São Miguel Paulista, da construtora TasBerg, têm em torno de 80m2 e custam cerca de R$ 200 mil. "Estamos vendo o ressurgimento da possibilidade de inventar para além dos estratos sociais, percorrendo a produção por inteiro. Por isso está também em São Miguel", diz o autor do projeto, o arquiteto Samuel Kruchin.
Além de mudança de comportamento, a "limpeza" das fachadas, com a remoção dos ornamentos, tem a ver com racionalizar a construção. "O neoclássico tem todos aqueles elementos artesanais, ou feitos em fôrmas metálicas, que atrasam e complicam a obra. O projeto mais limpo barateia a construção", diz Henrique Cambiaghi, arquiteto do Secovi (sindicato do setor imobiliário).


PROJETOS DEVEM SER DEMOCRÁTICOS E REFLETIR NOSSA ÉPOCA
Fernando Serapião
Especial para Folha

A cidade é uma construção coletiva e espelha nas obras públicas e privadas os anseios da sociedade. Imaginando que seria desejável construir um ambiente urbano democrático, é interessante que a arquitetura expresse nossa época.
Não se trata de alardear um único estilo, que não reflita a diversidade. Diferente do período moderno, cuja arquitetura tinha códigos linguísticos precisos, o pensamento arquitetônico atual permite a convivência de correntes variadas.
Porém, não se admite no saber arquitetônico erudito a adoção sem critério do vocabulário de línguas mortas.

COLETIVO

Fazendo um paralelo com a polêmica em voga, tal como a cartilha que reza que a língua falada pode desobedecer a norma culta, ninguém vai preso por construir, projetar ou morar em prédios sem compromisso com a construção coletiva; mas não é difícil imaginar por que dinheiro e poder às vezes são associados à ignorância arquitetônica (um lembrete: o prédio onde está o apartamento de R$ 6,5 milhões do ministro tem estilo neoclássico).
A mudança que está ocorrendo no mercado imobiliário paulistano é apenas um bom indício: na maioria das vezes, os novos prédios trocaram a roupagem neoclássica para linhas retas (muitas vezes feitas pelos mesmos "estilistas").
Arquitetura não é moda. Não é juízo de valor: a questão é a permanência. Afinal de contas, enquanto calças boca de sino vão para o brechó, prédios permanecem décadas visíveis.
Por isso, arquitetura com qualidade é mais do que uma fachada reta: deve ter o compromisso com a construção do bem comum. Mas como podemos identificar um projeto assim? Por exemplo, naqueles com gentilezas urbanas (que aumentam as calçadas, por exemplo) e que investem em tecnologia (desenvolvem a indústria do país).
O ápice serão os casos de vanguarda, que avançam na pesquisa de expressões e colaboram com a formação da identidade cultural do país. Alguns poucos empreendedores -de pequeno e grande porte- perceberam essa diferença: além de ganhar dinheiro e pensar nos lucros estão contribuindo na construção de uma cidade melhor. E, ao que parece, parte dos clientes também.


DO BOLO DE NOIVA AO CONTEMPORÂNEO
Entenda a evolução da arquitetura nas construções

Fim do séc. 19 a 1930 - Eclético ou bolo de noiva: Inspirada nos estilos acadêmicos europeus, muito ornamentados.
Déc. de 1930 a 1940 - Art Déco: Estilização, geometrização, predominância dos cheios sobre os vazios.

Déc. de 1930 a 1960 - Modernista: Predominância dos vazios (janelas), diálogo com a rua.

Déc. 1970 - 1990 - Pós-moderno: Excesso de cores, volumes e elementos na fachada, janelas menores.

Déc. de 1990 a 2000 - Neoclássico: Colunas, arcos, ornamentos na fachada, uso de uma cor só.

Déc. 2000 - 2010 - Contemporâneo: Aberturas amplas, novos materiais, flexibilidade da planta, diálogo com a rua.

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